Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem achei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem,
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: Fui eu?
Deus sabe, porque o escreveu.
Fernando Pessoa
Na fila do autocarro estavam um pai e seus 16 filhos. Junto a eles, um senhor de meia-idade, com uma das pernas de pau. O autocarro chegou, a criançada entrou primeiro e ocupou os bancos que estavam disponíveis. Os dois senhores entraram e ficaram em pé.
Na arrancada, o senhor da perna de pau, com a visível dificuldade, desequilibrou-se para trás, e o barulho foi inconfundível: TOC... TOC... TOC...TOC...
Quando o autocarro travou, a mesma coisa conteceu: TOC... TOC... TOC...TOC...
Na arrancada, novamente: TOC... TOC... TOC...TOC...
E assim foi, várias vezes...
Num determinado momento, já incomodado com o barulho e ao mesmo tempo tentando ser gentil, o pai das 16 crianças disse ao perneta:
- Perdão, senhor, gostaria de fazer uma sugestão. Por que o senhor não coloca uma borrachinha na ponta do pau? Com certeza vai diminuir o barulho e incomodar menos as pessoas...
De imediato, o cavalheiro da perna de pau respondeu:
- Agradeço a sugestão, mas se o senhor tivesse colocado uma borrachinha na ponta do SEU ... há alguns anos atrás, estaríamos todos sentados numa boa...